- O que é
A doença de Pompe é uma doença hereditária do metabolismo do grupo das doenças lisossomais de sobrecarga. É uma doença genética causada por mutações no gene que codifica a enzima alfa-glucosidade ácida, essencial para a degradação do glicogénio em glicose nos lisossomas. O glicogénio é uma forma de armazenamento de glicose, a principal fonte de energia da maior parte das células do corpo humano.
Quando a célula necessita de energia, usa enzimas para degradar o glicogénio, uma dessas enzimas encontra-se nos lisossomas, a alfa-glucosidase ácida.
A redução ou ausência de atividade da alfa-glucosidade ácida, conduz à acumulação de glicogénio nos lisossomas de vários tecidos, em particular células cardíacas, esqueléticas e musculares lisas. A consequência final desta acumulação é a lise e dano celular.
- Quem é afetado
A Doença de Pompe é uma doença hereditária autossómica recessiva que afeta homens e mulheres, ou seja, para que a doença se desenvolva é necessário ter mutação nos dois alelos. No caso de uma criança com doença de Pompe, ambos os pais são portadores de um alelo mutado e os seus irmãos têm 25% de probabilidade de ter a doença e 50% de probabilidade de serem eles próprios portadores do alelo mutado. Os portadores não apresentam sinais de doença e normalmente desconhecem essa situação.
- Classificação
Definem-se duas formas principais da doença, com base no tempo de apresentação da mesma: a forma infantil (<1 ano de idade) e a forma tardia (> 1 ano de idade). Estes dois fenótipos correlacionam-se com a atividade da enzima alfa-glucosidade ácida. A forma infantil caracteriza-se por uma atividade < 1%, manifestando-se por isso antes de um ano de idade.
A forma tardia pode ter uma atividade da enzima entre 1 a 40%, consequentemente uma apresentação mais heterogénea com idade de início variável.
- Sintomatologia
A apresentação clínica da forma de início tardio da doença de Pompe é altamente variável, no que diz respeito à idade de início, gravidade da doença, órgãos envolvidos e curso clínico. Esta ampla variabilidade clínica resulta da heterogeneidade genética, com mais de 200 mutações diferentes do gene alfa-glucosidade ácida relatados, e da variação do défice da atividade da enzima que codifica.
Os primeiros sintomas podem ser inespecíficos como fadiga generalizada, mialgias e contracturas musculares. Numa fase posterior, a doença progride com envolvimento proximal dos músculos da cintura pélvica e do tronco, com perda da atividade motora grosseira como andar, subir escadas e correr.
Ao longo do tempo pode verificar-se o envolvimento dos músculos da cintura escapular e músculos faciais (com ptose palpebral uni ou bilateral). O envolvimento do diafragma e músculos axiais paraespinhais, ocorre frequentemente e é responsável pelo desenvolvimento de escoliose e insuficiência respiratória em 1/3 dos doentes. Outras alterações ventilatórias também são comuns, sobretudo no período noturno, como apneia obstrutiva do sono, hipoventilação e roncopatia.
Apresentam uma incidência aumentada de aneurismas cerebrais, pelo envolvimento do músculo liso da parede dos vasos das artérias cerebrais. A nível gastrointestinal pode manifestar-se com dificuldade na mastigação ou deglutição com fadiga dos músculos masseterinos e reflexo faríngeo fraco. Ao contrário da forma infantil, a cardiomiopatia é rara e pode manifestar-se sob a forma de hipertrofia ventricular direita não relacionada com hipertensão pulmonar e alterações do ritmo cardíaco.
- Tratamento
Não existe tratamento curativo da Doença de Pompe. No entanto, a terapia de reposição enzimática tem sido bem tolerada, com bom perfil de eficácia e segurança e atenua a progressão clínica da doença. A terapia de reposição enzimática, envolve a administração intravenosa de alfa-glucosidade ácida humana recombinante, aprovada pela primeira vez pela FDA em 2006, ajudando a remover o glicogénio acumulado nos lisossomas das células. A dose administrada é de 20mg/kg/peso de 15 em 15 dias.
Além desta terapia, a abordagem assenta no tratamento sintomático e de suporte. O suporte respiratório, com fisioterapia para fortalecer os músculos respiratórios ou com assistência respiratória por meio de ventilação não invasiva, uma vez que a maioria dos doentes tem algum grau de comprometimento ventilatório/insuficiência respiratória. A fisioterapia é também recomendada para melhorar a força e a capacidade física.
A terapia da fala pode ser benéfica em alguns doentes para melhorar a articulação e deglutição. A terapia ocupacional e uso de auxiliares da marcha ou cadeira de rodas, a longo prazo, podem ser necessários. Alguns doentes também beneficiam de cuidados nutricionais com dietas especializadas em alto teor calórico e técnicas para diminuir o risco de aspiração.
A longo prazo poderá ser necessária a colocação de uma sonda nasogástrica ou gastrostomia percutânea endoscópica.
A abordagem da doença de Pompe deve ser multidisciplinar, com equipas especializadas, de forma a garantir um tratamento adequado destes doentes.
Elaborado por:
Dra. Sara Matos
Interna de Formação Específica de Neurologia
Centro de Referência de Doenças Hereditárias do Metabolismo, Serviço de Neurologia
Centro Hospitalar Universitário de Coimbra
- Referências:
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